Uma nova decisão do Supremo Tribunal Federal (STF), proferida no dia 16 de novembro, trouxe esperança aos titulares de patentes que buscam o ajuste do prazo para suas patentes no Brasil. O Ministro Luiz Fux afirmou que a decisão do STF na Ação Direta de Inconstitucionalidade (ADI) 5.529 “não veda que os órgãos jurisdicionais competentes autorizem a extensão, por prazo certo e razoável, de privilégios patentários, se presentes, no caso concreto, circunstâncias que demonstrem ter havido demora irrazoável, injustificada e excepcional do INPI na concessão do pedido de patente”.
Tal decisão foi proferida na Reclamação Constitucional[1] (RCL) 56.378/DF proposta pela Bristol-Myers Squibb (BMS) contra o indeferimento de seu pedido de liminar para manter a patente PI 0212726-1 (“726”). O Desembargador Relator que presidiu o julgamento do Agravo de Instrumento da BMS para reverter o indeferimento anterior negou a liminar sob o fundamento de que a concessão de tal medida violaria a fundamentação do STF na ADI 5.529. A patente Brasileira 726 expirou em 17 de setembro de 2022.
Nos parágrafos seguintes, fornecemos uma breve linha do tempo sobre os antecedentes da ADI 5.529 e o impacto de seu julgamento para o sistema de patentes do Brasil:
o parágrafo único do artigo 40 da Lei de Propriedade Industrial do Brasil (Lei nº 9.279/96) permitia um ajuste automático na data de vigência de patentes se o INPI demorasse mais de 10 anos para realizar a concessão; nesse sentido, se o INPI concedesse a patente em até 10 anos, seria aplicado o prazo usual de 20 anos a partir do depósito – se o INPI demorasse mais de 10 anos, o prazo seria automaticamente ajustado para 10 anos a partir da data da concessão.
a Procuradoria-Geral da República do Brasil peticionou ao STF requerendo que a Corte fizesse uso do controle concentrado de constitucionalidade no que diz respeito a esse ajuste automático por meio de uma Ação Direta de Inconstitucionalidade (ADI).
o Supremo Tribunal Federal decidiu que o ajuste automático da vigência ia, de fato, contra a previsão constitucional de que as patentes devem ser temporárias (nos termos do artigo 5º, inciso XXIX, da Constituição Federal do Brasil), uma vez que acarretava uma imprevisibilidade indevida quanto ao vencimento dos prazos das patente;
como forma de modular os efeitos dessa decisão, o STF dispôs ainda que os efeitos dessa declaração de inconstitucionalidade do parágrafo único do artigo 40, deveriam ser aplicados, em regra, a partir da data de publicação do ato decisório (01 de setembro de 2021; efeitos ex nunc). No entanto, segundo o Ministro Dias Toffoli: “Ficam ressalvadas da modulação (i) as ações judiciais propostas até o dia 7 de abril de 2021 (data da concessão parcial da medida cautelar no presente processo) e (ii) as patentes que tenham sido concedidas com extensão de prazo relacionadas a produtos e processos farmacêuticos, bem como a equipamentos e/ou materiais de uso em saúde. A ambas as situações se aplica o efeito ex tunc da decisão, o que resultará na perda das extensões de prazo concedidas com base no parágrafo único do art. 40 da LPI, devendo ser respeitados os prazos de vigência das patentes estabelecidos no caput do art. 40 da Lei 9.279/1996 e resguardados eventuais efeitos concretos já produzidos em decorrência da extensão de prazo das referidas patentes”.
A sentença proferida no processo ADI 5.529, como esperado, foi prejudicial aos interesses dos titulares de patentes brasileiras, uma vez que a demora do INPI é um fato notório no processamento de patentes no Brasil – especialmente nos setores farmacêutico e de telecomunicações.
Em resposta à retirada da salvaguarda contida no parágrafo único do artigo 40, iniciou-se uma onda de litígios na Justiça Federal. Muitos titulares de patentes brasileiras ingressaram com reclamações no Judiciário pedindo o reajuste dos prazos de suas patentes devido à demora injustificada do INPI.
Até o momento, 41 casos de PTA estão em trâmite na Justiça Federal. Desse total de ações, apenas 4 sentenças já foram proferidas – todas negando o ajuste pleiteado pelos titulares de patentes e, dessa forma, aguardam atualmente o reexame pelos Tribunais Regionais Federais em sede de apelação. Os casos que tiveram seu mérito negado no nível distrital referem-se a patentes de produtos farmacêuticos, quais sejam: Stelara®, OFEV®, Ozempic®, Rybelsus®, and Sutent®.
Em relação aos pedidos que buscam assegurar a manutenção da vigência das patentes, até o momento, existem 4. Referem-se às patentes PI 0113110-9 (Simponi®); PI 0113109-5 (Stelara®); PI 0209249-2 (Uptravi®); PI 0212733-4 e BR 12 2012 023120 (Brintelix®).
Após essa rápida recapitulação, voltamos nossa atenção à recente decisão do Ministro Fux, proferida na última quarta-feira (16.11.2022), que marca um passo importante no desenvolvimento dos PTA no Brasil: um Ministro do STF se posicionou claramente em uma ação judicial pós ADI a favor da possibilidade de os Tribunais ajustarem os prazos das patentes caso a caso com base em atrasos injustificados do INPI.
Tal decisão é um importante contraponto à decisão do Ministro Toffoli, de 22 de junho de 2022, que decidiu favoravelmente à EMS S/A na RCL 53.181/DF ao revogar a liminar da Hypera para manter vigente a patente que cobre o medicamento Alektos® (PI 0215703-9). A decisão do Ministro Toffoli destacou que a concessão de liminar para prorrogar o privilégio temporário da patente vai contra a fundamentação do entendimento do STF na ADI 5.529, em que o STF afirmou a necessidade de um critério objetivo não relacionado à eventual demora no processamento da patente até eventual prorrogação do prazo da patente.
Embora a decisão do Ministro Fux seja encorajadora para os titulares de patentes, a questão está longe de ser resolvida. Tal decisão ainda deverá passar pelo referendo da Primeira Turma do STF. Além disso, uma série de decisões caso a caso deverá seguir nos próximos meses.
O Judiciário, entretanto, se mostra bem cauteloso com relação à construção de uma jurisprudência clara quanto à admissibilidade dos PTA no direito brasileiro. Nesta quarta-feira (23.11.2022), uma semana após a decisão do Min. Luiz Fux, a 5ª Turma do TRF-1 adiou o julgamento da primeira apelação em PTA. Resta, aos titulares de patentes brasileiras, aguardar os próximos pronunciamentos do Judiciário a respeito do tema.